domingo, 24 de julho de 2016

“Vanitas vanitatum”

Narciso - Caravaggio

"Vanitas vanitatum et omnia Vanitas" 1

Batizar um texto com uma frase em latim é algo completamente cult. Mera demonstração do capital intelectual de quem o escreve, temperada com um pouco de vaidade. Pensando bem, é considerável utilizar o latim numa redação de vestibular. Afinal de contas, se um candidato diz que algo é uma condição sine qua non, ele não apenas merece a vaga que tanto almeja conquistar. Uma bela cadeira na Academia Brasileira de Letras também cairia bem! Nada como usar um daqueles elegantíssimos trajes dos acadêmicos e participar de uma instituição que foi presidida pelo Bruxo do Cosme Velho (“Machadão” para os íntimos ou Machado de Assis para os outros)!

Afastando-se desse universo de letrados e seus figurinos, é válido ir ao banheiro de uma residência dentre as várias que existem na metrópole paulistana. Um de seus habitantes raspa a barba, assim como tantos outros que odeiam ter esse aspecto demonstrativo de idade. Aos poucos, o rosto vai ficando limpo, e a vaidade vai crescendo exponencialmente. Ao final do processo, um sorriso: nosso personagem está jovem novamente! Narciso, se estivesse em seu lugar, deliraria com tamanha beleza!

“Vaidade das Vaidades!” Ou melhor, reescrevendo a frase para dar uma elegância maior, “vanitas vanitatum!” Você, o mal presente em cada ser humano que já respirou, respira ou respirará até a extinção dos séculos, não se cansa de coroar cada indivíduo como rei de um reino praticamente existente na cabeça dele! Você, que dá a cada mortal alguns momentos de prazer e vanglória, cega a quem cede as suas vontades! Como o homem pode escapar de você?

Quem nunca cedeu às tentações dessa terrível senhora, olhando-se no lago de Narciso moderno (denominado “espelho” ou “câmera frontal”), que atire a primeira pedra! Quem nuca quis ser chamado de “dotô” (ou de CEO, de repente), que atire a primeira pedra! E vamos seguindo a nossa existência: uma eterno teatro de constantes vaidosos!
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1 "Vaidade das vaidades, tudo é vaidade!” (Eclesiastes 1, 2)