quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

A pedra da maturidade

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Uma possível interpretação para uma obra prima do saudoso Carlos Drummond de Andrade lembra que a vida não é plana: há sempre uma bendita (ou maldita) pedra no meio do caminho. Uma pedra de tropeço que muitas vezes se apresenta, para os exagerados, como a pior desgraça do universo. Mas eis que vem o senhor tempo e modifica radicalmente essa visão: “Um dia perceberás a importância da pedra!”

Não ser aprovado no vestibular não é a maior catástrofe da humanidade. O conformismo do mal desempenho na prova gera um pensamento assim, e evita o desânimo. Mas há sempre a encarnação demoníaca em forma de remorso rondando os pensamentos do infeliz reprovado, assim como uma “muriçoca doida”, martelando: “Ah, você poderia ter se dedicado mais! Ah, você poderia ter queimado os seus neurônios estudando 27 horas por dia! Ah, você poderia ter feito 6,02x10²³ exercícios!” . A maldita voz rapidamente vai embora, e dá lugar à voz do senhor tempo: “Viu agora como a pedra foi necessária?”

E realmente foi. Foi a melhor coisa que aconteceu! Muitas vezes é preciso existir um tempo de aperfeiçoamento pessoal e amadurecimento para seguir adiante na vida. É esse tempo que faz o indivíduo perceber que algumas coisas são essenciais para todos. Um ano inteiro de aulas do curso pré-vestibular é capaz de virar para baixo a cabeça de alguém, e fazer esse alguém perceber o que poderia ter percebido há muito tempo. Talvez essa seja a essência da maturidade.

Tratar os aprendizados do ensino médio, principalmente absorvidos de modo mais rápido no “cursinho” como meras ferramentas para conquistar o sonho de “ver o nome na lista” é possuir uma visão muito superficial do que realmente aconteceu. “Então, o que realmente aconteceu? Ah, já sei! Aprendi como eu vou gabaritar aquela prova elaborada com a influência de entidades isentas de boas intenções (já que a banca fez “páquito”), o que me dará aquela tão sonhada vaguinha!”

Pode até dar. Mas, de que adianta sentar nos bancos universitários e não conhecer  o mundo ao seu redor? Chegou o momento de perceber a necessidade da pedra! Pedra que possibilitou ao infeliz reprovado melhorar não apenas o seu conhecimento de mundo, mas a sua capacidade crítica de analisá-lo. Ainda mais nos tempos atuais, onde essa capacidade está gradualmente indo para o ralo, e se transformando em insultos e xingamentos, além de uma assustadora polarização. Foi no “cursinho” que o indivíduo aprendeu a perceber as nuances e significados ocultos dos textos que se encontram pelo mundo afora. Foi no “cursinho” que o mesmo confirmou o caráter divino das ciências exatas, por mais difíceis que sejam. Foi no “cursinho” que ele entendeu a importância da análise do passado para compreender o presente. Foi no “cursinho” onde ele aprendeu a ser um verdadeiro cidadão! E ser um verdadeiro cidadão possui uma importância maior do que ser um mero universitário.